O que é o Real Clicker Training? Origens e Análises de Estudos Científicos
Hoje compartilho com vocês um artigo escrito por Gary Wilkes, renomado treinador de cães com mais de 30 anos de experiência, conhecido por seu trabalho pioneiro com o uso do clicker. Wilkes foi um dos primeiros a popularizar o termo "Real Clicker Training" e sua abordagem é fundamentada tanto em estudos científicos quanto em práticas amplamente testadas no campo do comportamento canino. Este artigo traz uma análise crítica sobre o que realmente constitui o treinamento com clicker e explora as lacunas e suposições que cercam essa prática.
Ao ler este artigo, convido todos a deixarem de lado as emoções e a analisarem os fatos e argumentos de forma objetiva, com base nas evidências e na experiência profissional.
Origens do Clicker Training e o Debate sobre sua Aplicação
Em maio de 1992, Gary Wilkes e Karen Pryor realizaram um seminário conjunto na Califórnia, onde o termo "clicker training" foi usado pela primeira vez. Wilkes já havia treinado mais de 1.000 cães naquela época, lidando principalmente com cães em estágios críticos de comportamento. Pryor, por sua vez, trazia anos de experiência no treinamento de mamíferos marinhos, baseado nos princípios de condicionamento operante desenvolvidos por B.F. Skinner. O livro de Pryor, Don't Shoot the Dog, trouxe muita atenção ao treinamento positivo, sugerindo que o reforço positivo poderia ser a base para moldar comportamentos sem a necessidade de controle aversivo.
No entanto, Wilkes argumenta que essa visão, amplamente aceita no mundo do adestramento, não reflete a realidade prática. Ele observa que o livro de Pryor, embora tenha criado um movimento em torno do reforço positivo, apresenta falhas ao desconsiderar a necessidade de consequências negativas para comportamentos inadequados. Segundo ele, a ideia de que o controle aversivo é desnecessário ou perigoso simplifica demais o comportamento animal e ignora a realidade dos cães em situações de vida real.
A Crítica às Suposições do Reforço Positivo
Uma das principais críticas levantadas por Wilkes é a suposição de que o reforço positivo pode controlar qualquer comportamento e que o controle aversivo é sempre desnecessário. Embora essas premissas sejam aceitas em muitos círculos de adestramento, Wilkes ressalta que elas são baseadas em estudos feitos com animais em cativeiro, como ratos e golfinhos, que não enfrentam os mesmos desafios comportamentais que os cães, especialmente em ambientes urbanos.
Ele enfatiza que, embora o reforço positivo seja uma ferramenta poderosa, ele tem suas limitações, especialmente quando aplicado a comportamentos instintivos, como a caça. Um exemplo clássico, segundo Wilkes, é tentar impedir um Jack Russell Terrier de perseguir um esquilo apenas com o uso de recompensas — algo praticamente impossível sem algum tipo de controle aversivo.
Evidências Científicas: Reforço Positivo versus Controle Aversivo
Wilkes também destaca a importância de olhar para a ciência de forma crítica. Um estudo marcante citado por ele envolveu cães treinados com diferentes métodos, incluindo o uso de clickers e de controle aversivo, como colares de pinos e eletrônicos. O estudo mostrou que, em algumas situações, o controle aversivo foi mais eficaz e produziu menos estresse do que o reforço positivo. Essa evidência contraria a crença de que o uso de punição sempre gera mais estresse e sofrimento do que o reforço positivo.
Adicionalmente, Wilkes menciona o fenômeno do "desvio instintivo", identificado por Keller Breland, que mostra que certos comportamentos instintivos dos animais podem se sobrepor ao aprendizado baseado apenas em recompensas. Isso reforça a necessidade de considerar métodos aversivos em certas situações, especialmente quando o comportamento do cão envolve respostas instintivas que não podem ser controladas apenas com reforços positivos.
O Mito de um Mundo Livre de Coerções
A visão de que é possível treinar cães sem qualquer forma de coerção ou punição é, segundo Wilkes, uma fantasia. Ele argumenta que o controle aversivo é uma parte fundamental do treinamento de cães há milhares de anos e que essa abordagem, quando usada corretamente, não causa trauma ou sofrimento aos animais. Wilkes usa o exemplo de cães de trabalho, como os Border Collies, que são corrigidos rapidamente durante o treinamento, mas que ainda assim permanecem felizes e eficientes em suas tarefas.
Para ele, a verdadeira questão não é se devemos ou não usar punição, mas como e quando utilizá-la de forma ética e eficaz. O treinamento de cães deve equilibrar o uso de reforço positivo e controle aversivo para garantir que o cão aprenda de forma confiável e possa viver em harmonia com as pessoas e outros animais.
Conclusão: Uma Abordagem Equilibrada para o Treinamento de Cães
O treinamento real com clicker, como defende Wilkes, não exclui o uso de controle aversivo, mas o integra de maneira ética e controlada. A verdadeira eficácia do treinamento está em adaptar as técnicas ao comportamento natural dos cães e ao contexto em que vivem. Ignorar a necessidade de punição ou controle aversivo é, na visão de Wilkes, negar a realidade do comportamento animal.
No final, o que realmente importa é o resultado: cães felizes, equilibrados e capazes de viver de forma segura em sociedade. Para isso, é necessário um treinamento que combine reforços positivos e consequências negativas de forma inteligente e eficaz.
O *Real Clicker Training* de Wilkes é, portanto, uma abordagem que não se limita às fantasias de um mundo sem coerção, mas que reconhece a complexidade do comportamento canino e a importância de aplicar técnicas de maneira prática e responsável.